De cocar na cabeça e microfone na mão, Dam Kuy A’ki subia ao palco. “Eu sinto que a natureza hoje pede socorro junto com seu povo, que cuidava e preservava com o seu muito saber”, entoava na canção “Mente Aberta”.
A faixa de reggae resume um pouco das mensagens sobre resistência dos povos originários que trazia junto a sua banda, a Kruviana.
O vocalista também cantava na língua do seu povo, makuusi, uma das formas de valorização da cultura indígena, que tanto defendia. Participava de grupos de jovens e da associação Kaopi, onde contribuía em diálogos e mobilizações sociais.
“No dia a dia, era falante, sorridente e engraçado. Sempre disposto a ajudar o próximo e de fácil amizade”, afirma a irmã Sara Vitória dos Santos, 29.
Daniel dos Santos Pereira nasceu no dia 21 de novembro de 1993, em Boa Vista, onde foi criado com os seis irmãos. Filhos de uma indígena da antiga comunidade Macedônia, que fica em Normândia (RR), aprenderam com a matriarca os costumes e o respeito à terra.
O talento para as artes surgiu ainda na infância. O menino, que era bem estudioso, desde pequeno desenhava, cantava e tocava violão, além de jogar capoeira.
Após concluir o ensino médio, chegou a ingressar na faculdade de matemática —sua matéria preferida na escola—, mas a veia artística pulsou mais forte. Após um curso de grafite, prestou novamente o vestibular, em 2021. Passou a cursar artes visuais na Universidade Federal de Roraima (UFRR).
Largou o trabalho que tinha na época, mesmo com uma filha para criar, mas dizia ser preciso porque estava adoecendo. “Você tem que ser muito corajoso para viver o seu sonho”, diz a esposa, Jessica Greyciane Cardoso, 27.
Em um projeto fora das aulas, retomou as atividades musicais, onde surgiu a banda Kruviana. Foi seu nome indígena, Dam kuy A’ki, que adotou como assinatura artística. Dizia que encontrou ali o que buscava na construção de sua identidade.
Na universidade, por duas vezes foi presidente do centro acadêmico. Entre uma reunião e outra, conheceu Jessica, passaram a namorar e depois a dividir a vida. Ela se tornou sua confidente de desabafos e ouvinte de seus cantos com o ukulele. E ele a surpreendia ao chegar com flores colhidas no caminho de volta para casa ou chocolates.
Seja nos corredores da universidade ou pelas ruas da cidade, era conhecido pelo jeito alegre e falante. “Eu falava que ele tinha a síndrome do prefeito, porque todo mundo conhecia ele”, afirma a esposa.
Dam se afogou nas águas do rio Curupira no dia 4 de outubro. Foi encontrado morto no dia seguinte, aos 31 anos.
Deixa a mãe, Maria Luiza, 62, o pai, Nelito, 66, a mulher, Jessica Greyciane, 27, e uma filha, Sarah Danielly, 4. Também ficam seis irmãos, além de sobrinhos.
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Fonte UOL
