As ações de mineradoras de ouro estão superando o bitcoin e as principais empresas de IA (inteligência artificial), em meio a uma disparada no preço dos metais preciosos que impulsiona ainda mais o rali das companhias “esquecidas” que os extraem do subsolo.
O índice S&P Global Gold Mining acumula alta de 126% neste ano, o melhor desempenho entre os setores monitorados pelo S&P.
A valorização de um setor frequentemente visto como destruidor de valor deve render lucros robustos a empresas como Agnico Eagle, Barrick Mining e Newmont, que se beneficiaram da alta de 52% no preço do ouro desde o início de janeiro.
“Tem sido um ano muito bom para as ações de mineradoras de ouro”, disse Imaru Casanova, gestora da VanEck. “Elas têm mais dinheiro do que sabem o que fazer com ele.”
Mas o desempenho acima da média também reacendeu dúvidas sobre a capacidade de manter disciplina financeira no setor, que ainda é assombrado pelas lembranças da corrida do ouro após a crise financeira global e pelo colapso que veio depois.
Naquele período, à medida que o preço do ouro disparava, o aumento dos lucros alimentou uma onda de fusões e aquisições, bônus milionários para executivos e custos de produção crescentes. O ajuste foi brutal: do pico em 2011, as ações de mineradoras de ouro despencaram 79% nos quatro anos seguintes.
“Muito valor foi destruído”, afirmou Casanova. “Na cabeça dos investidores, isso ainda está fresco. As empresas aprenderam com os erros do ciclo anterior? Ou vão repeti-los?”
O ouro ultrapassou US$ 4.000 por onça nesta semana, impulsionado pela paralisação do governo americano, pela forte demanda de bancos centrais e por temores de aumento das dívidas soberanas.
As ações das mineradoras vêm superando o próprio metal, já que, com custos de produção diários relativamente fixos, o aumento do preço se converte diretamente em lucro.
A Agnico Eagle acumula alta de 113% no ano; a Barrick, de 114%; e a Newmont, de 134%. As ações da Zijin Gold dobraram desde sua estreia em 30 de setembro, na segunda maior oferta pública inicial do ano.
Para comparar, Nvidia subiu 40%, Oracle, 72%, Alphabet (Google), 30%, e Microsoft, 25%. O bitcoin valorizou 31%.
Mesmo assim, gestores de fundos especializados em ouro temem um retorno aos excessos do passado e cobram prudência das empresas.
“Por enquanto elas estão se comportando bem”, disse Keith Watson, cogestor do fundo Golden Prospect. “É o tipo de história de ‘mostre para eu acreditar’. Esperamos que, ao manterem a disciplina, recuperem a confiança do mercado.”
George Cheveley, gestor do fundo de mineração de ouro da gestora Ninety One, observou que um setor historicamente “sem prestígio” tende a “gerar lucros em rajadas curtas”, por ser altamente cíclico.
“Como ganham dinheiro muito rápido, acabam exagerando”, disse. “No começo será extremamente lucrativo. Alguns manterão a disciplina, outros não.”
A pressão por melhores retornos já chega às salas de reunião: Newmont e Barrick anunciaram novos presidentes-executivos na semana passada.
Segundo Matthew Murphy, analista do BMO Capital Markets, a decisão surpresa da Barrick de substituir Mark Bristow provavelmente se deveu ao “desempenho inferior das ações em relação às concorrentes”.
Os executivos agora precisam decidir como alocar a enxurrada de capital que se avizinha —o BMO prevê US$ 60 bilhões em fluxo de caixa livre para o setor no próximo ano.
Evy Hambro, chefe de investimentos temáticos e setoriais da BlackRock, afirmou que “devolver capital aos acionistas, que esperaram pacientemente, deve ser prioridade para as mineradoras, agora que desfrutam de margens robustas”.
Ele defende que as empresas priorizem pagamento de dividendos em vez de recompras de ações. “Melhor ainda seria permitir que os acionistas recebessem em um ETF lastreado em ouro, em vez de apenas dólares ou outras moedas”, sugeriu.
Mesmo assim, a tentação de buscar novas aquisições pode ser difícil de resistir. A escassez de novas minas pode levar à consolidação do setor, à medida que produtores tentam repor reservas esgotadas pela extração.
Embora as ações estejam em alta, operações de fusão por troca de ações, como a recente união entre Anglo American e Teck Resources, podem servir de modelo, dizem analistas.
Outro motivo de preocupação entre acionistas é que os executivos das mineradoras —já entre os mais bem pagos da indústria de mineração— possam novamente abocanhar parte dos ganhos.
Em 2017, Marcelo Kim, sócio da Paulson & Co, causou polêmica ao criticar as mineradoras por pagarem valores “excessivos” a seus dirigentes, dizendo que os investidores agiam como “ovelhas indo para o abate” ao aprovar tais pacotes.
Hoje presidente da Perpetua Resources, Kim reconhece maior disciplina desta vez, mas alerta contra exageros: “Espero que ninguém receba pacotes milionários só porque o preço do ouro subiu. Isso não é mérito deles”, disse. “Mas, se fizerem as coisas certas, vão ganhar rios de dinheiro.”
Fonte UOL
